domingo, 26 de janeiro de 2014

Mas é só um cachorro

Criança e cachorro quem gosta é o dono. Frase muito popular e que, de uma certa forma, combina comigo. Antes que atirem ossos e chocalhos em mim, tenho filhos e cachorro. Tenho dificuldade em chegar na casa de alguém e logo de cara fazer bilú no bebê ou cócegas na barriga do peludo. Fico na minha. Quem não fica na dele é o peludo ou o dono do chocalho.
Ambos aproximam-se de mim, sem cerimônia. As crianças ficam me olhando com cara de quem-é-essa-tia e um tempo depois estão grudadas nas minhas pernas, colo, braços e brincadeiras. Os cães enfiam seus focinhos em partes que não lhes dizem respeito e me deixam embaraçada. Se for um gato, é mais simples. Ele só fica se enroscando nas minhas pernas. O dono do infante ou do animal costuma dizer, noooossa, ele foi com a sua cara - ! - você deve adorar filhotes. Sorrio amarelo-alaranjado e digo que adorar não é o termo, gosto, tenho 2 filhos e 1 cachorro, e por aí vai a conversa, em que termino sendo uma adoradora de filhotes. Seja ele de 2 ou 4 patas. Tenho um gostar do tipo básico. E ponto final.
Uma amiga abriu um negócio para pets, os bichinhos de estimação. Fui uma das primeiras a comprar uma coleira da marca que ela lançou para Matuto, o novo habitante da casa. Além das coleiras e itens básicos para cães, ela estava pesquisando novos mercados, novas possibilidades - camisetas, cadernos, capas para celulares, etc - e fazendo perguntas a respeito dos produtos, para as quais respondi não ser do tipo que anda com camiseta estampada com a foto do meu bichinho. Nem os de 2 patas, nem o de 4. Lembro que ela riu com o comentário - comentário este que eu mesma tive que engolir, quando me apaixonei pelos cadernos com estampa de labrador. Melhor teria sido ficar de boca fechada.
Recentemente um amigo entrou na categoria pai. Conversa vai, conversa vem, entramos naquele papo de previsão do futuro para filhos, planilha de expectativas que não contemplam o pequeno recém chegado e, sinceramente, não me lembro como saímos de filho para cachorro. Deve ter sido culpa minha, pois vira e mexe chamo meu filho pelo nome do cachorro e vice-versa. Eu sei, é horrível. Só vai me entender quem tiver dois adolescentes em casa, um de 2 patas e outro de 4. Espero. Aqui em casa dão risada. Já aceitaram que estou ficando gagá.
O fato é que, durante a conversa com meu amigo, a frase "mas é só um cachorro" ecoou mais de uma vez. Eu não consegui contra-argumentar. É fato. É um cachorro.
Voltei pra casa com a frase ecoando na minha orelha. Fui até o quintal, abri a porta para que Matuto entrasse rebolando todo e fazendo uma festa parecida com a que fiz quando minha filha voltou do intercâmbio. Eu ainda estava com a cabeça na frase, fiz um carinho qualquer, peguei um copo de água, fechei a porta da geladeira, falei pra ele "vem", e fomos para meu escritório. Continuei pensando no que me incomodava, com Matuto sentado aos meus pés e, de vez em quando, dando umas roncadas. E suspiradas profundas - não entendo o tanto que um labrador suspira, deitado de lado, patas esticadas. Às vezes enrolado, parecendo um gato. O que eu tenho certeza é que não existe outro lugar em que ele preferiria estar. E eu pensando... mas é só um cachorro? Deixei essa pergunta de lado até receber a notícia que a companheira mais fiel desta amiga empreendedora, depois de uns 12 anos se não estou enganada, faleceu. Antes de ligar para ela, eu já estava chorando. Choro dos egoístas, pois olhei para o Matuto e pensei, "droga, ele vai antes de mim - se for pela lei da natureza", e doeu. Imaginei o que ela estava sentindo. Os passeios no Ibirapuera, a água de côco que a Manu tanto gostava, os carinhos que recebia de todas as pessoas, os planejamentos estratégicos que ela fez quando desenhou seu negócio, tendo ao lado a labradora marrom. As viagens para o Rio, a ideia de desenvolver um negócio apoiado no amor que sentia por aquele ser de 4 patas. E a saudade que agora fica.
Meu amigo até tinha razão. É só um cachorro. Mas não é só isso.

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